5 de março de 2006

Comissão Nacional Justiça e Paz
Reflexão para a Quaresma

Para consultar o melhor que a Igreja "faz" em Portugal (na minha opinião):
http://www.agencia.ecclesia.pt/noticia.asp?noticiaid=29175

Aqui deixo um excerto:

Se a pobreza é uma situação extrema a exigir, com urgência, a nossa reflexão e o nosso empenhamento em erradicá-la, também as grandes disparidades de riqueza, de rendimento e de conhecimento não podem deixar-nos indiferentes. É que, por detrás de uma grande desigualdade, está sempre uma injustiça gritante e um funcionamento injusto de um sistema de organização da economia e da sociedade. Por outro lado, a grande desigualdade de riqueza e rendimento gera fenómenos de indesejável concentração de poder que podem minar os alicerces da própria democracia, é causa de esbanjamento de recursos, e suscita, por emulação, padrões médios de consumo e estilos de vida desequilibrados e desajustados em relação a um padrão de desenvolvimento humano sustentável.
(...)
A influência do marketing, cada vez mais sofisticada e poderosa, vem levando muitas pessoas a adoptar padrões de consumo desproporcionados relativamente ao seu respectivo nível de rendimento, com uma dupla consequência negativa: o endividamento excessivo das famílias, não raro para fazer face a encargos com aquisição de bens que seriam dispensáveis, e a distorções das prioridades na satisfação de necessidades básicas de alimentação, educação, saúde ou segurança. Estamos perante a emergência de uma verdadeira cultura de consumismo com consequências sociais e ecológicas preocupantes que não devem ser subestimadas.
(...) Dir-se-á que o consumo sustenta a procura e esta é factor que incentiva a produção e o emprego e por isso constitui um esteio necessário ao crescimento económico. Trata-se de uma verdade unilateral, pois oculta outras dimensões da realidade, nomeadamente as seguintes:
- é desejável orientar as opções de consumo para bens que aumentem o bem-estar efectivo e a qualidade de vida dos consumidores, o que nem sempre é assegurado pela publicidade;
- os gastos em consumo devem ser proporcionados ao nível médio de rendimento de quem consome;
- é de evitar o desperdício e o supérfluo, de modo a respeitar o equilíbrio ecológico;
- o uso do dinheiro, como o de todos os outros recursos, não deve eximir-se ao crivo dos critérios da solidariedade e do bem comum.
Em suma: há que respeitar o princípio de que a economia está ao serviço das pessoas, como frequentemente é recordado nos textos da doutrina social da Igreja.
Por outro lado, a propensão consumista é co-responsável de um outro problema que afecta, muito negativamente, o nosso modo de viver. Referimo-nos aos ritmos de vida stressantes que marcam o nosso quotidiano, sobretudo nas grandes cidades, e que estão associados aos esforços que visam conseguir maiores rendimentos, com vista a consumir mais e alcançar patamares sempre mais ambiciosos de vida material. Os reflexos negativos desta atitude são visíveis não só na saúde dos próprios como no enfraquecimento e na perda de qualidade das relações intra-familiares, no cuidado com as crianças e no tempo que lhes é dispensado pelos seus pais, bem como na prestação de cuidados aos familiares idosos. Também a vida cívica, política, cultural e religiosa se ressente da falta de tempo e disponibilidade da população.
A este propósito, deixamos algumas interrogações a que só cada um/a poderá responder:
- Será que vale mesmo a pena continuar com estes ritmos de trabalho stressantes? A que bens teríamos de renunciar se optássemos por uma vida de menos stress? E o que ganharíamos em troca?
- Com o progresso material já alcançado, não deveríamos valorizar mais as relações humanas e dar maior prioridade aos bens relacionais e à qualidade da vida pessoal, familiar e comunitária, nomeadamente naqueles casos em que já se ultrapassaram as barreiras do necessário?
- Não será este um tempo oportuno para reorganizarmos a nossa vida por forma a criar condições para a oração e a contemplação?
- Não estaremos, inadvertidamente, a servir o deus dinheiro e a sacrificar-lhe os nossos melhores dons e energias?

2 de março de 2006

A "one drop rule"

"A 'one drop rule' é algo que nunca foi aplicado senão aos negros, e é uma regra que consiste em consiste em considerar como negro qualquer pessoa que tenha uma gota de sangue negro que seja", explica Rhett Jones, historiador da Brown University. "Isto significa que um branco pode dizer que tem uma avó apache, mas nunca poderá dizer que tem uma tetravó negra porque, se for assim, então ele é negro e não branco". É a visão racista do sangue negro como uma infecção. Basta uma gota para que a contaminação seja total.
Uma coisa do passado? Por incrível que pareça, não. Michael Omi, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, contou o caso de uma senhora que, ao realizar um certo trâmite administrativo, foi informada de que deveria identificar-se como negra (em muitos documentos oficiais norte-americanos, usados para fins estatísticos, exige-se uma identificação da raça e/ou da etnia).
"Sempre se tinha considerado branca e não fazia a mínima ideia de que possuia um antepassado negro, mas os registos diziam que ela tinha 1/32 avos de sangue negro. Era uma tetravó escrava, de nome Margarida", contou Omi. "O choque foi tão grande que a senhora ficou doente três dias. Depois resolveu levar o caso a tribunal e perdeu no Supremo em 1983. Um recurso interposto em 1986 não foi aceite".

in PÚBLICO 23 de Fevereiro 1995.