Ao contrário do se pensa, flirtar não é uma actividade exclusivamente romântica. Nem só as pessoas que pretendem atingir um nível considerável de intimidade física flirtam. Qualquer pessoa que queira ser apreciada e aceite num âmbito onde lhe falta alguma coisa (amizade, amor, trabalho), flirta, isto é, seduz e deixa-se seduzir com gosto.
Flirtar é falar de coisas banais, olhando-se nos olhos de forma ambígua, e sentir que foi tudo muito profundo. É passar subrepticiamente do cenário real onde nos encontramos para um cenário alternativo, de cores mais vivas e sensações mais cruzadas e presentes. E sentir magia, mesmo num parque de estacionamento.
Os amigos recentes flirtam, os vizinhos flirtam, os colegas de trabalho flirtam. Têm momentos fugazes em que sentiram que estavam a viver um segredo (mesmo à luz do dia) e que só o outro (o parceiro do flirt) é que percebe exactamente o que aqueles 20 segundos significaram.
A idade é irrelevante, as diferenças de idade também, e, surpreendentemente, embora seja mais habitual que os dois sujeitos do flirt sejam de sexos diferentes (ou reciprocamente atractivos, para não excluir ninguém), nem isso é imprescindível. Duas amigas que acabaram de se conhecer e desejam imenso agradar uma à outra para encontrarem a confidente ideal, flirtam. Há que admiti-lo.
Claro que nem sempre estamos numa de flirtar, claro, e nem com toda a gente. É preciso estar na mesma disposição, ao mesmo tempo, na mesma altura. O que, na verdade, nem sempre acontece, mas também não é assim tão difícil. E quando começa o flirt, nem é preciso gostar das mesmas piadas e ter a mesma agilidade cognitiva: porque quando flirtamos, ficamos todos muito mais susceptíveis e qualquer boca fácil se torna irresistível.
É digno de nota que flirtar implica uma intimidade inesperada, por isso velhos amigos não flirtam. Em geral. Mas, pelo contrário, breves flirts podem evoluir para se tornarem bons amigos.
Ou não. Também podem desaparecer como todas as coisas breves. E voltar só a ser colegas de trabalho.
Permanecerá a sensação incómoda de que aquele momento com aquela conversa sob aquela luz ténue foi especial e se perdeu. Até ao dia em que parecerá só pateta.
E então está definitivamente na altura de arranjar outro flirt.
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